No universo saturado de narrativas sobre o poder e a decadência moral das elites, o filme “Mountainhead” surge como uma provocação mordaz e oportuna. Assinado por Jesse Armstrong, criador da aclamada série Succession, o longa não se contenta em revisitar temas já explorados na televisão: ele os comprime em um espaço claustrofóbico e os leva ao limite do absurdo.
Com um elenco que reúne nomes como Steve Carell, Cory Michael Smith, Jason Schwartzman e Ramy Youssef, o filme parte de uma sátira distópica para abordar algo desconfortavelmente familiar — os efeitos colaterais de um mundo moldado por bilionários tecnológicos que confundem genialidade com delírio. Mais do que rir da elite, Armstrong propõe que o riso pode ser nossa única forma de resistir a ela.
Sinopse do filme Mountainhead (2025)
Em meio a um colapso global alimentado por desinformação, guerras e o descrédito da imprensa, quatro magnatas do setor de tecnologia se reúnem em um retiro anual nas montanhas geladas de Utah. O anfitrião é Hugo “Sopão” (Jason Schwartzman), criador de um aplicativo de meditação e o mais “pobre” entre os ricaços.
Com ele estão Randall (Steve Carell), uma figura poderosa do governo americano que enfrenta um câncer terminal; Jeff (Ramy Youssef), responsável por uma IA capaz de distinguir fake news em segundos; e Venis (Cory Michael Smith), o homem mais rico do mundo e dono da maior rede social do planeta, a Traam.
O encontro, que deveria ser um momento de relaxamento e jogatina, se transforma em um desfile de ideias megalomaníacas e propostas apocalípticas. Enquanto o mundo desmorona do lado de fora, os quatro discutem como lucrar com a tragédia, flertando com golpes de estado, extinção de populações e ascensão da consciência digital. Tudo isso embalado por diálogos velozes, referências filosóficas e um cinismo afiado.
➡️ Covid, hormônios e frigobares: ‘Viagem de Formatura – Mallorca’ tenta ser mais do que é
Crítica de Mountainhead, da Max
“Mountainhead” não é sutil. Ao contrário: Jesse Armstrong opta por escancarar a desumanização de uma elite que, mesmo diante do colapso global, prefere brincar de deuses em seus retiros luxuosos. A sátira funciona ao colocar o espectador frente a frente com personagens que beiram a caricatura, mas que carregam traços reais de figuras como Elon Musk, Mark Zuckerberg e outros “visionários” do Vale do Silício.
Venis, interpretado com frieza por Cory Michael Smith, é um Zuckerberg com mais charme e menos escrúpulos. Sua nova ferramenta de IA — capaz de criar fakes indistinguíveis da realidade — desencadeia uma série de eventos catastróficos. O mais assustador? Ele não demonstra arrependimento, apenas preocupação com sua posição e influência.
Já Jeff, vivido por Ramy Youssef, representa o bilionário com resquícios de consciência, mas incapaz de se opor com firmeza às atrocidades de seus pares. Ele é o “adolescente” do grupo, inseguro, passivo e facilmente manipulável.
➡️ ‘Coração Delator’ emociona sem desafiar – e talvez esse seja o problema
Personagens grotescos, mas perigosamente verossímeis
Embora nenhum dos protagonistas pareça plenamente realista em sua totalidade, Armstrong acerta ao captar o espírito desses tempos: homens imaturos com acesso irrestrito a ferramentas de poder inédito. A ideia de que esses bilionários são emocionalmente atrofiados não soa exagerada, mas sim uma consequência lógica da idolatria que os cerca.
Jason Schwartzman brilha como o patético Sopão, cuja necessidade desesperada de validação o torna o mais humano — e, paradoxalmente, o mais irrelevante. Steve Carell, por sua vez, entrega um Randall que tenta driblar a morte através da tecnologia, enquanto considera aceitar ideias como “preservar a mente humana na nuvem” ou colonizar planetas, como se isso fosse uma simples decisão orçamentária.
➡️ ‘O Jogo da Viúva’ é sombrio e perturbador como o crime que o inspira
Um ‘Sucession menor’ ou uma sátira com identidade própria?
Comparações com Succession são inevitáveis — e estimuladas pelo próprio filme. Dos zooms improvisados à trilha de Nicholas Britell, o DNA da série está em todo lugar. Porém, “Mountainhead” não tem tempo para construir nuances nem para desenvolver arcos complexos. É um ensaio concentrado, onde a repetição de ideias e a limitação espacial (toda a trama se passa na casa de Sopão) tornam o filme por vezes estagnado.
Ao mesmo tempo, essa limitação parece proposital. Armstrong não quer contar uma história de transformação, mas registrar o que acontece quando quatro pessoas com poder ilimitado conversam sem filtros. O resultado, infelizmente, é desigual: os diálogos afiados e repletos de filosofia (há menções a Ayn Rand e até a Jamal Khashoggi) às vezes se perdem no próprio excesso de cinismo.
Técnica eficiente, mas sem o mesmo impacto
A direção de Armstrong emula o estilo documental desenvolvido em Succession, com câmeras que simulam espiadas e cortes abruptos que buscam tensão. Mas falta dinamismo. A ausência de Mark Mylod — diretor-chave da série — pesa. O filme, mesmo com ideias potentes, carece de ritmo e de um olhar visual mais inventivo. Isso o torna menos impactante do que poderia ser.
O elenco é competente, mas ninguém, exceto Schwartzman, parece realmente ultrapassar o que está no papel. Faltam os momentos memoráveis, como aqueles de Sarah Snook ou Kieran Culkin em Succession. Sem essas performances marcantes, “Mountainhead” fica preso entre o cômico e o sombrio, sem se comprometer totalmente com nenhum dos dois.
Conclusão
“Mountainhead” é uma obra imperfeita, mas necessária. Seu maior mérito está em colocar os holofotes sobre o comportamento de uma elite que se vê acima da humanidade — e que, muitas vezes, tem o poder de moldar o futuro sem prestar contas a ninguém. Mesmo com limitações de ritmo e desenvolvimento, o filme é um exercício provocador que mistura distopia, sátira e drama filosófico.
Jesse Armstrong, ainda que repita algumas fórmulas, entrega um longa que se encaixa perfeitamente no espírito da era digital: desconcertante, frenético e eticamente desconectado. Um lembrete ácido de que, no fim das contas, os verdadeiros vilões da ficção podem estar apenas a um toque de tela de distância.
Siga o Flixlândia nas redes sociais
+ TikTok
+ YouTube
Onde assistir ao filme Mountainhead?
O filme está disponível para assistir na Max.
Trailer de Mountainhead (2025)
Elenco de Mountainhead, da Max
- Steve Carell
- Jason Schwartzman
- Cory Michael Smith
- Ramy Youssef
- Daniel Oreskes
- Hadley Robinson
- David Thompson
- Ali Kinkade