É sempre um fenômeno curioso quando uma produção de recepção crítica modesta escala vertiginosamente os rankings de popularidade de um gigante como a Netflix. Este é o caso de “Brick”, um thriller de ficção científica alemão que, apesar de avaliações mornas, encontrou um lugar de destaque no pódio dos mais assistidos.
A obra do diretor Philip Koch chega com uma premissa claustrofóbica e potente, mas a grande questão que fica é se o filme consegue construir algo sólido sobre seu promissor alicerce ou se desmorona sob o peso das próprias ambições.
Sinopse
A trama nos apresenta a Tim (Matthias Schweighöfer) e Olivia (Ruby O. Fee), um casal à beira do colapso de sua relação. Em um timing quase perverso, no exato momento em que decidem se separar, eles acordam para uma nova realidade: seu prédio de apartamentos foi completamente selado do mundo exterior por um impenetrável e misterioso muro preto.
Sem comunicação, sem saída e com recursos cada vez mais escassos, eles e os outros moradores são forçados a uma convivência extrema, onde a paranoia, as teorias conspiratórias e a luta pela sobrevivência testam os limites da natureza humana.
Crítica
Não há como negar a força do conceito inicial de “Brick”. A ideia de um confinamento inexplicável é um prato cheio para o suspense, e o diretor Philip Koch demonstra ter consciência disso. Nos melhores momentos, o filme é um exercício de tensão atmosférica.
Koch utiliza os espaços limitados do prédio com inteligência, movendo a câmera de forma ágil por corredores estreitos e frestas, enquanto a fotografia de Alexander Fischerkoesen emprega sombras e enquadramentos apertados para amplificar a sensação sufocante de aprisionamento.
A premissa ecoa clássicos do gênero de sobrevivência minimalista, como Cubo (1997), onde a lógica e a mecânica da fuga são o motor da narrativa. As cenas em que os personagens testam as propriedades do muro ou tentam mapear sua nova realidade são, de longe, as mais eficazes, pois se concentram na simplicidade coesa de um bom filme de gênero.
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O peso dos arquétipos e o drama deslocado
Onde “Brick” começa a ruir é justamente quando tenta ser mais do que um thriller de sobrevivência. O roteiro, ambicioso, sobrecarrega a base sólida com subtramas dramáticas que frequentemente escorregam para o melodrama.
O conflito central do casal protagonista, que já vivia um “isolamento” emocional antes do físico, prometia uma rica camada psicológica. Contudo, essa dinâmica é explorada através de diálogos rasos e situações que parecem forçadas, desperdiçando a química inegável entre Schweighöfer e Fee.
O problema se agrava com a introdução dos personagens secundários. Em vez de se sentirem como pessoas reais reagindo a uma crise, eles funcionam como um checklist de arquétipos: o vizinho teórico da conspiração, o avô protetor e armado, o casal de turistas hedonistas.
Cada um serve apenas como um veículo para expor uma diferente teoria ou reação à situação, transformando o que poderia ser um desenvolvimento orgânico de conflitos em uma exposição quase professoral. Essa escolha enfraquece o impacto dos embates e impede que o espectador se conecte genuinamente com o destino da maioria deles.
Entre a paranoia e a pretensão
Ao abandonar o foco na mecânica de sobrevivência para flertar com a crítica social, “Brick” perde o rumo. As tentativas de tecer comentários sobre paranoia política e o “deep state” soam forçadas, como se o roteiro tivesse consultado os trending topics em busca de relevância instantânea.
A violência, quando ocorre, é surpreendentemente limpa e contida, uma timidez que enfraquece o suspense e a sensação de perigo real. Comparado a obras que mesclam confinamento e crítica social de forma visceral, como o espanhol O Poço ou o britânico No Topo do Poder, “Brick” parece acanhado demais para defender suas próprias ideias.
O filme fica em um limbo desconfortável, hesitando entre o terror sci-fi, o drama de relacionamento e o thriller conspiratório, sem se aprofundar de verdade em nenhum deles. A revelação final, embora chocante e capaz de gerar a aflição que fez falta no restante da projeção, chega tarde demais.
A metáfora visual, repetida à exaustão, de moscas presas em copos, resume a própria falha do filme: é uma imagem óbvia demais para ser inteligente e sutil demais para impactar de fato.
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Conclusão
“Brick” é um filme que irrita pela quantidade de potencial desperdiçado. Possui uma direção competente, uma atmosfera claustrofóbica bem construída e uma dupla de protagonistas carismática. No entanto, é sabotado por um roteiro indeciso que tenta abraçar múltiplos gêneros e temas, mas acaba não fazendo justiça a nenhum.
Quando se concentra no suspense prático da sobrevivência, funciona e prende a atenção. Quando tenta ser um drama psicológico profundo ou uma crítica social afiada, torna-se raso e, por vezes, constrangedor.
A produção cumpre seu papel como um entretenimento passageiro e tenso, o que talvez explique seu sucesso na plataforma. Contudo, para os que buscam um thriller de ficção científica memorável e bem resolvido, a experiência será frustrante. “Brick” ergue um muro intrigante, mas esquece de construir uma história verdadeiramente sólida por trás dele.
Assista ao trailer de Brick (2025)
Elenco do filme Brick
- Matthias Schweighöfer
- Ruby O. Fee
- Frederick Lau
- Salber Lee Williams
- Murathan Muslu
- Sira-Anna Faal
- Axel Werner
- Alexander Beyer
- Josef Berousek