O caso Ângela Diniz retorna ao debate nacional quase meio século após o crime que abalou o Brasil, graças à estreia da série Ângela Diniz: Assassinada e Condenada na HBO Max. Essa produção revisita a trajetória trágica da socialite mineira e os controversos julgamentos que se seguiram, baseada no podcast documental Praia dos Ossos.
O crime é um dos mais emblemáticos da história judicial brasileira, tornando-se um divisor de águas na luta contra a violência de gênero no país. A nova obra busca dar voz à vítima e expor o machismo estrutural da época que permitiu a culpabilização da própria mulher assassinada. A série é uma parceria entre a HBO Max e a produtora de cinema Conspiração.
Quem foi Ângela Diniz? A socialite que desafiou padrões conservadores
Ângela Maria Fernandes Diniz era conhecida por sua independência, estilo de vida ousado e beleza marcante na sociedade mineira e carioca dos anos 1960 e 1970. Nascida em uma família da alta sociedade de Minas Gerais, ela desafiou os padrões de sua época ao buscar sua autonomia e liberdade, o que era incomum naqueles anos.
Sua decisão de se divorciar do primeiro marido, Milton Villas Boas, após nove anos e três filhos, foi um gesto ousado e simbólico. Essa escolha era vista como impensável para uma mulher daquele período, especialmente porque o divórcio só foi legalizado no Brasil em 1977.
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Doca Street e o assassinato em Búzios (1976)
Em 1976, Ângela iniciou um relacionamento com Raul Fernando do Amaral Street, conhecido como Doca Street, que durou cerca de quatro meses. Amigos da socialite relataram que Doca demonstrava crises de ciúmes e tentava proibi-la de sair, um sinal de uma relação conturbada e abusiva.
O trágico desfecho ocorreu em 30 de dezembro de 1976, na casa de praia deles, na Praia dos Ossos, em Armação dos Búzios, no Rio de Janeiro. Após uma discussão, Doca Street confessou ter assassinado Ângela com quatro tiros à queima-roupa.
O crime ganhou grande repercussão e chocou o país, não apenas pela brutalidade, mas pela maneira como a vítima acabou sendo colocada no banco dos réus.
O que foi a tese da “legítima defesa da honra”?
No primeiro julgamento, realizado em 1979, Doca Street alegou “legítima defesa da honra”, estratégia cruel que culpabilizava a vítima, retratando Ângela como uma mulher de “moral duvidosa”. A defesa alegou que Doca teria agido para preservar sua dignidade masculina ao reagir a uma suposta agressão à sua honra.
Essa tese, vista hoje como profundamente misógina, encontrou eco no sistema jurídico da época, influenciando diretamente a condenação de Doca. Ele recebeu uma pena branda de apenas dois anos de prisão, com direito à suspensão, o que lhe permitiu sair em liberdade e gerou ampla revolta.
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Qual o impacto do caso Ângela Diniz na luta contra o feminicídio?
A condenação branda causou imediata indignação pública e impulsionou o movimento feminista no Brasil. A comoção nacional foi tamanha que levou à criação do lema “Quem ama não mata”, adotado nos protestos contra a violência de gênero.
Diante da pressão popular, um novo julgamento foi marcado para 1981, onde a tese da honra foi rebatida. Desta vez, Doca Street foi condenado a uma pena mais severa, recebendo 15 anos de prisão em regime fechado por homicídio doloso. Ele acabou sendo libertado em 1987.
Embora o caso Ângela Diniz não tenha mudado a lei diretamente, ele foi um divisor de águas que expôs a misoginia institucionalizada. Décadas depois, em 2023, o Supremo Tribunal Federal (STF) declarou a tese da legítima defesa da honra inconstitucional, afirmando que ela viola a dignidade humana, a proteção à vida e a igualdade de gênero.
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A série ‘Ângela Diniz: Assassinada e Condenada’
A minissérie da HBO Max narra a trajetória da socialite, das noitadas na sociedade carioca da década de 1970 ao desfecho trágico, em seis episódios. Marjorie Estiano interpreta Ângela, enquanto Emilio Dantas assume o papel de Doca Street, e Antônio Fagundes vive o advogado Evandro Lins e Silva.

Os realizadores tiveram o cuidado de não espetacularizar a morte dela, optando por não mostrar a cena do assassinato, mas apenas sugerir os disparos. O diretor Andrucha Waddington explicou que a decisão dialoga com o fato de que a violência já é detalhada com crueldade no julgamento, e o foco deve ser na vítima.
A série busca abrir um debate importante, reforçando que a obra é sobre “a assassinada”, e não sobre o criminoso, e que a tese de defesa da honra, embora juridicamente inaceitável, ainda é a base de muito do pensamento que gera a violência de gênero hoje. A produção estreou no dia 13 de novembro e segue até 11 de dezembro com lançamentos semanais.













