O desafio era imenso: fazer um remake de “Vale Tudo”, a novela que ajudou a redefinir o papel do folhetim na televisão brasileira e que, desde 1988, ecoa como um retrato agudo do país.
A nova versão assinada por Manuela Dias e dirigida por Paulo Silvestrini chegou ao horário nobre da TV Globo cercado de expectativas — e de desconfianças. Com elenco estelar, estética refinada e respeito à obra original, o primeiro capítulo mostrou que a proposta é ousada, mas não inconsequente. A adaptação de 2025 caminha entre o tributo e a reinvenção.
Sinopse do remake de Vale Tudo (2025)
O episódio de estreia nos apresenta novamente à história de Raquel (Taís Araújo), guia turística em Foz do Iguaçu, mulher íntegra e batalhadora, e sua filha, Maria de Fátima (Bella Campos), jovem ambiciosa que não se conforma com uma vida simples. Durante a festa de 23 anos da filha, tensões familiares emergem. A jovem já mostra sinais do plano que colocará em curso: sair da cidade, conquistar um lugar na elite e usar quem for preciso para isso, inclusive o modelo decadente César (Cauã Reymond), com quem transa após se passar por hóspede de um hotel de luxo.
O conflito de gerações e valores se acirra quando Fátima pede ao avô, Salvador (Antônio Pitanga), que facilite um esquema de contrabando. A negativa dele dá o tom ético da novela. Após sua morte, a jovem aproveita a brecha para vender a casa da família sem consentimento da mãe e foge para o Rio de Janeiro, deixando Raquel sem chão. A primeira de muitas traições está feita.
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Crítica da novela Vale Tudo, da TV Globo / Globoplay
O maior acerto do episódio inaugural do remake de “Vale Tudo” é não tentar competir com o original. Ao contrário, o remake assume que está mexendo em um patrimônio afetivo e cultural, e faz disso sua maior força. Referências visuais, diálogos espelhados e até o samba “Isto Aqui o Que É?”, de Caetano Veloso, ajudam a ancorar a trama no universo consagrado por Gilberto Braga, Aguinaldo Silva e Leonor Bassères.
Mas Manuela Dias não é refém da nostalgia. A autora injeta atualizações pontuais que não soam forçadas: o sonho de Fátima agora é ser influenciadora, a discussão sobre violência doméstica ganha novo contorno com Raquel revidando a agressão do ex-marido, e o figurino e a trilha sonora dialogam com a estética pop de 2025.
Bella Campos e o peso de um legado
Se há uma personagem que carrega o peso da memória coletiva, é Maria de Fátima. Glória Pires eternizou a vilã com charme e cinismo inimitáveis. Bella Campos opta por um tom mais impulsivo, menos malicioso, o que gera uma personagem ainda em construção — crível nas cenas mais leves, mas com menos intensidade nos embates dramáticos. Ainda assim, o saldo é promissor. Com mais tempo de tela, pode encontrar o equilíbrio necessário.
Taís Araújo, por sua vez, acerta em cheio ao compor uma Raquel menos expansiva que a de Regina Duarte. Há uma firmeza serena em sua entrega, uma dignidade contida que emociona. O embate entre as duas, mesmo quando contido, carrega tensão suficiente para mover a trama.
O Brasil que (não) se vê
É impossível falar de “Vale Tudo” sem falar de Brasil. E aqui talvez esteja o ponto mais controverso do remake. A versão de 1988 refletia um país recém-saído da ditadura, tomado por inflação e desconfiança generalizada. O remake suaviza esse pano de fundo, talvez em busca de um público mais amplo, talvez por opção ideológica mesmo. O resultado é um Brasil menos reconhecível — mais bonito nas paisagens, mais limpo nos diálogos, menos combativo nos temas.
Mesmo com a presença de uma família preta como protagonista e diálogos que flertam com a crítica social, o episódio parece evitar qualquer enfrentamento mais direto. Manuela Dias, em entrevista ao “Estadão”, justificou que deseja retratar um Brasil “menos polarizado”. Mas, ao tentar agradar a todos, o texto pode perder parte do impacto que consagrou o original.
Direção segura e estética convidativa
A direção de Paulo Silvestrini aposta em cenas abertas, planos aéreos e cores vibrantes. É uma novela mais iluminada, mais viva. Os diálogos são longos, quase teatrais, o que contrasta com a agilidade do texto original de Braga. Essa escolha pode exigir paciência de parte da audiência, mas oferece espaço para a construção mais profunda dos personagens.
A estreia também economizou no número de núcleos — ainda não vimos Odete Roitman (Débora Bloch) ou Heleninha (Paolla Oliveira), por exemplo —, o que permitiu foco e coesão narrativa. É um começo contido, mas eficaz.
Conclusão
O primeiro episódio do remake de “Vale Tudo” não decepciona. Ao contrário: apresenta um projeto sólido, consciente da sua herança e ousado o suficiente para não se limitar a ela. Com atuações firmes, direção elegante e uma narrativa que honra o passado sem parecer datada, a novela mostra que pode caminhar com as próprias pernas.
Resta saber se, ao longo da jornada, terá coragem de olhar o Brasil nos olhos como fez a versão original. Porque, no fim das contas, a pergunta que segue ecoando é a mesma de 1988: vale a pena ser honesto no Brasil?
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Onde assistir ao remake de Vale Tudo?
A novela está disponível para assistir com novos episódios todos os dias na TV Globo e no Globoplay.
Trailer de Vale Tudo (2025)
Elenco do remake Vale Tudo
- Taís Araujo
- Debora Bloch
- Bella Campos
- Paolla Oliveira
- Renato Góes
- Alice Wegmann
- Humberto Carrão
- Cauã Reymond
- Carolina Dieckmann
Ficha técnica da novela Vale Tudo (2025)
- Gênero: drama
- País: Brasil
- Temporada: 1
- Episódios: 1
- Classificação: 12 anos