Crítica do filme 'Uma Vida Honesta', da Netflix (2025) - Flixlândia (1)

‘Uma Vida Honesta’ e a falsa crítica social

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O cinema, em sua essência, tem sido um poderoso espelho da sociedade, refletindo suas tensões, desigualdades e aspirações. Em 2019, testemunhamos uma onda de produções que se debruçaram sobre as nuances do classismo, com obras como Parasita, Entre Facas e Segredos e Artigo 15 dissecando as abismos econômicos e sociais. Esses filmes, de maneiras distintas, apontaram para a falta de solidariedade de classe e a invisibilidade de certas realidades.

No entanto, o cenário atual parece estar tomando um rumo preocupante. É nesse contexto que “Uma Vida Honesta” (Ett ärligt Liv), o novo thriller sueco de Mikael Marcimain, lançado nesta quinta-feira (31) na Netflix, se insere, prometendo uma análise da “vida fora da lei” e das colisões ideológicas.

Contudo, a análise aprofundada da obra revela uma intenção que se afasta da crítica social genuína, enveredando por um caminho que beira a propaganda, transformando o lema “coma os ricos” em um perigoso “odeie os pobres”.

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Sinopse

“Uma Vida Honesta” nos apresenta Simon, um jovem estudante de Direito que chega a Lund com grandes ambições e a determinação de conquistar o mundo. No entanto, suas expectativas rapidamente se chocam com a realidade. Durante uma violenta manifestação, ele cruza o caminho de Max, uma jovem anarquista por quem se sente imediatamente atraído.

Esse encontro fortuito o arrasta para uma espiral de excessos, mentiras e perigos. Simon, seduzido pelo carisma de Max e pelo idealismo radical de seu grupo de “bandidos” – que inclui Dinah, Robin, Gustaf e o líder Charles, e que se autodenominam “homens modernos à la Robin Hood” – se vê envolvido em roubos a pessoas ricas, justificados pela crença de que a elite deveria compartilhar sua fortuna.

No entanto, quando uma de suas operações sai do controle, Simon é forçado a confrontar as consequências de suas escolhas e a perceber que talvez o caminho da lei fosse menos perigoso do que a vida fora dela. O filme explora a transformação de Simon, sua perda de direção em um mundo onde ideais colidem com a violência, e os temas da traição e das relações de classe.

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Crítica

À primeira vista, “Uma Vida Honesta” se propõe a ser um mergulho na sedução da rebelião e na colisão de ideais. Simon, um aspirante a escritor que se resigna ao Direito por sentir que não tinha “nada real a dizer”, é apresentado como um protagonista vulnerável, permeável à influência.

Seu choque com a realidade social é sublinhado pela dinâmica com seus colegas de quarto ricos, Ludvig e Gustaf, que o tratam como serviçal, escancarando a divisão de classes. Essa é uma premissa promissora para discutir a desigualdade e a busca por propósito em um mundo fragmentado. No entanto, a execução da narrativa de Linn Gottfridsson se desvia perigosamente de uma análise social nuançada.

Demonização caricata

O filme parece vestir a máscara do “coma os ricos”, uma tendência em voga, mas não demora para que essa fachada comece a desabar. A representação dos “bandidos”, que supostamente lutam contra o sistema, rapidamente os transforma em figuras monstruosas: viciados em drogas e sexo, moralmente repreensíveis. Essa demonização é tão caricata que anula qualquer possibilidade de empatia ou compreensão de suas motivações.

Enquanto isso, os personagens que representam a classe abastada proferem frases como “somos nós que criamos empregos”, uma retórica que convenientemente ignora as falhas estruturais do capitalismo. A roteirista parece estar menos interessada em criticar o sistema e mais em justificar a opulência, retratando qualquer voz que se levante contra o status quo como “a escória da terra”.

A falta de nuance atinge seu ápice ao culpar dois imigrantes pela “profanação da cultura sueca”, um tropo preocupante que ressoa com discursos xenófobos. Essa abordagem não é acidental; ela reflete, de forma distorcida, as narrativas disseminadas por mídias e políticos financiados por interesses capitalistas, minando qualquer chance de um debate significativo sobre consciência e solidariedade de classe.

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Cena do filme 'Uma Vida Honesta', da Netflix (2025) - Flixlândia
Foto: Netflix / Divulgação

Falhas na direção e no desempenho

Mesmo que a intenção da roteirista fosse a de propaganda, um diretor competente poderia ter utilizado essa energia para criar um filme que, no mínimo, fosse visualmente atraente ou dramaticamente envolvente. Infelizmente, Mikael Marcimain não se mostra esse cineasta. Apesar de algumas escolhas estéticas, como planos com split-diopter e uma fotografia granulada que remete aos thrillers nórdicos, “Uma Vida Honesta” é, em sua essência, um exercício de lentidão e artificialidade.

A montagem é, para dizer o mínimo, desastrosa. Cenas de diálogos básicos são picotadas de forma irritante, prejudicando o fluxo narrativo e a imersão do espectador. O ritmo geral é agonizantemente lento, estendendo uma história de talvez 20 minutos para quase duas horas, com o aparente objetivo de martelar na audiência uma aversão a tudo que se opõe ao capitalismo.

A inabilidade de Marcimain em extrair performances críveis de seu elenco é outro ponto fraco. Simon Lööf e Nora Rios, que ocupam a maior parte do tempo de tela, falham em transmitir qualquer emoção genuína ou identificável. Suas atuações são mecânicas, sem a profundidade necessária para carregar um drama que se propõe a ser psicológico e impulsionado por personagens. O restante do elenco de apoio é igualmente fraco, resultando em um conjunto que não convence e que, em última análise, torna a experiência do espectador dolorosa.

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A realidade sueca e a persistência da propaganda

É inegável que a Suécia, a despeito de seus altos índices em inovação e democracia, não está isenta de problemas sociais, incluindo questões de racismo, discriminação e criminalidade. É plausível que a ideia inicial por trás de “Uma Vida Honesta” fosse abordar essas complexidades.

No entanto, como tem acontecido em diversas produções “de elite”, o filme rapidamente se transformou em uma peça de propaganda, culpando os menos favorecidos e expressando empatia pela “dificuldade” dos ricos.

Essa tendência não é um evento isolado. O movimento “coma os ricos”, que de fato atingiu a raiz de muitos problemas sociais – o capitalismo –, naturalmente incomodou o “um por cento” que detém o poder. A resposta tem sido o financiamento de narrativas que distorcem a realidade e manipulam a percepção pública.

“Uma Vida Honesta” se encaixa perfeitamente nesse molde, alertando o público a ser cético e a buscar produções que abordem a divisão econômica com a nuance e a complexidade que o tema exige.

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Conclusão

“Uma Vida Honesta” chega à Netflix com a promessa de um thriller sueco intrigante sobre amor, anarquia e crime. Contudo, ao invés de uma análise aprofundada da dicotomia social e psicológica, o filme se revela uma obra com sérias falhas narrativas e diretivas, que utiliza a roupagem da crítica social para veicular uma mensagem simplista e, por vezes, preconceituosa.

A tentativa de explorar a “sedução da rebelião” e a “perda de orientação” de um jovem estudante se dissolve em uma caricatura panfletária que falha em entregar tanto um thriller envolvente quanto um drama social relevante. Para os entusiastas de thrillers psicológicos e dramas sociais, a expectativa de uma trama que desvende as tensões da sociedade sueca pode ser frustrada por uma abordagem que carece de autenticidade e profundidade.

Em vez de uma reflexão honesta sobre as fissuras da sociedade, “Uma Vida Honesta” se torna um exemplo de como a arte pode ser distorcida para fins questionáveis. Se você busca uma narrativa que realmente desafie suas percepções sobre classe e ideologia, é prudente procurar em outro lugar.

Onde assistir ao filme Uma Vida Honesta?

O filme está disponível para assistir na Netflix.

Assista ao trailer de Uma Vida Honesta (2025)

YouTube player

Elenco de Uma Vida Honesta, da Netflix

  • Simon Lööf
  • Nora Rios
  • Willy Ramnek Petri
  • Nathalie Merchant
  • Arvid von Heland
  • Peter Andersson
Escrito por
Taynna Gripp

Formada em Letras e pós-graduada em Roteiro, tem na paixão pela escrita sua essência e trabalha isso falando sobre Literatura, Cinema e Esportes. Atual CEO do Flixlândia e redatora do site Ultraverso.

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