O cinema adora falar sobre si mesmo, e quando você junta um diretor autoral como Noah Baumbach (História de um Casamento) com lendas como George Clooney e Adam Sandler, a expectativa vai lá no teto. “Jay Kelly”, que chega ao catálogo da Netflix, é exatamente essa aposta de peso: uma obra que transpira prestígio e cheiro de temporada de premiações. No papel, é um home run; na tela, é uma criatura curiosa, por vezes fascinante e, em outros momentos, estranhamente desconexa.
É um filme meta, quase um espelho distorcido da realidade, onde Clooney interpreta uma versão alternativa de si mesmo — um astro amado pelo público, herdeiro do carisma da velha guarda, mas que por dentro questiona se existe algo além do personagem que ele finge ser há décadas.
Sinopse
Conhecemos Jay Kelly (George Clooney) em seu habitat natural: um set de filmagem, “morrendo” em uma cena dramática. Mas a verdadeira crise começa quando as câmeras desligam. Jay é um ator veterano que viveu tanto tempo sob os holofotes que sua identidade pessoal foi engolida pela sua persona pública. Ele descobre que seu antigo mentor e diretor, Peter Schneider, faleceu, e ao mesmo tempo percebe que sua filha mais nova, Daisy (Grace Edwards), está prestes a partir para uma viagem pela Europa, preferindo a companhia dos amigos à do pai ausente.
Movido por um impulso (e talvez pelo medo da mortalidade), Jay decide seguir a filha até Paris e depois para a Itália, onde ele deve receber um prêmio por sua carreira em um festival de cinema. Ele não vai sozinho, claro. A reboque vai seu fiel séquito: Ron Sukenick (Adam Sandler), seu empresário devoto; Liz (Laura Dern), sua publicista; e Phoebe (Emily Mortimer), sua cabeleireira pessoal. O que deveria ser uma viagem de glória torna-se uma jornada de acerto de contas com o passado, incluindo reencontros tensos com velhos amigos e memórias de relacionamentos negligenciados.
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Resenha crítica do filme Jay Kelly
A desconstrução do ídolo (e de George Clooney)
O grande trunfo e, ironicamente, a maior armadilha do filme é a escalação de George Clooney. Jay Kelly é um homem que não consegue andar na rua sem ser assediado, alguém que troca o convívio familiar pela adoração de estranhos. Clooney traz seu charme habitual, aquele sorriso de megawatt, mas aqui ele o utiliza como uma máscara. O filme sugere que Jay é um homem de alma vazia, cujas memórias são, na verdade, cenas de filmes.
É uma performance vulnerável. Vemos um Jay inseguro, que precisa pintar as sobrancelhas com uma caneta Sharpie para parecer mais jovem e que, apesar de estar cercado de gente, está perpetuamente sozinho. A proposta de Baumbach é despir o mito, mostrando que por trás do glamour existe um homem que sacrificou filhas e amigos reais por uma aprovação efêmera.
No entanto, o filme às vezes luta para nos fazer sentir pena de um homem que tem tudo. É aquele velho problema de “problemas de gente rica e famosa” que pode soar um pouco como um “ai de mim” exagerado para o espectador comum.

Adam Sandler: o coração pulsante do filme
Se Clooney é a face do filme, Adam Sandler é a alma. Interpretando Ron, o empresário que está ao lado de Jay há 30 anos, Sandler entrega uma atuação contida e devastadora, lembrando seus melhores momentos em Joias Brutas ou Os Meyerowitz. Ron é a antítese de Jay: um homem de família (com uma esposa vivida por Greta Gerwig) que se anulou para servir ao astro.
A dinâmica entre os dois é fascinante e dolorosa. Ron ama Jay, talvez até mais do que ama a si mesmo, mas existe sempre aquela barreira invisível: Ron fica com 15% do que Jay ganha. É uma amizade? É um emprego? Sandler captura perfeitamente a exaustão de viver à sombra de outra pessoa, absorvendo os estilhaços emocionais de Jay enquanto tenta equilibrar sua própria vida pessoal pelo telefone. É Ron quem humaniza a narrativa, servindo como a âncora emocional quando a trama de Jay ameaça flutuar para longe na autoindulência.
Uma narrativa entre o sonho e a confusão
“Jay Kelly” tenta evocar clássicos como 8½ de Fellini ou O Jogador de Altman, misturando realidade, flashbacks e delírios. Há momentos brilhantes, como a sequência no trem pela Europa, onde o passado e o presente se colidem literalmente ao abrir de portas. Baumbach e a corroteirista Emily Mortimer tentam costurar memórias de audições passadas — incluindo uma cena roubada por Billy Crudup como Timothy, o amigo que Jay traiu para conseguir seu grande papel — com a correria do presente.
No entanto, o filme oscila muito. Por vezes, parece um diário de viagem desconexo; em outras, um drama profundo sobre arrependimento. Alguns personagens coadjuvantes, apesar de interpretados por atores incríveis como Laura Dern e Patrick Wilson, parecem subutilizados, existindo apenas como satélites na órbita do ego de Jay. A montagem nem sempre ajuda, criando um ritmo que vai do frenético ao contemplativo de forma abrupta, deixando a sensação de que o filme, assim como seu protagonista, está passando por uma crise de identidade.
Conclusão
“Jay Kelly” é um filme imperfeito sobre pessoas imperfeitas. Não é o melhor trabalho de Noah Baumbach, faltando-lhe a precisão cirúrgica de História de um Casamento, e pode parecer calculado demais em sua tentativa de ser “importante”. Contudo, é inegavelmente assistível. Há um charme antiquado na produção, uma beleza na cinematografia e, acima de tudo, atuações que valem o ingresso (ou a assinatura).
George Clooney entrega talvez seu papel mais metalinguístico e triste, mas é Adam Sandler quem você vai querer abraçar no final. É uma obra que reflete sobre o custo da ambição e como, no fim das contas, nossas identidades são apenas um amontoado de memórias — sejam elas reais ou roteirizadas. Se você gosta de filmes que exploram os bastidores da fama com uma dose de melancolia e outra de cinismo, “Jay Kelly” merece o play, mesmo que você precise ajustar suas expectativas.
Onde assistir ao filme Jay Kelly?
Trailer de Jay Kelly (2025)
Elenco de Jay Kelly, da Netflix
- George Clooney
- Adam Sandler
- Laura Dern
- Billy Crudup
- Riley Keough
- Grace Edwards
- Stacy Keach
- Jim Broadbent
- Patrick Wilson
- Eve Hewson















